O
POETA BORRACHÃO
Aquele corpo oscila entre o ereto e o vacilante…
avança, pára dançante, se inclina... fazendo vénia ao Deus Baco, fala como quem
quer sorver… vacila para tentar compreender, mas o cérebro delira como quem
sonha acordado.
De pé, procura a dignidade… /Sai um arroto com
densidade/, pede desculpa com educação. Empertigando o dedo… jura que são modos
com imprecisão, coisas que não controla, que a culpa é de estar encharcado no
soro da verdade.
Não sabendo fingir de tanta sinceridade… nem querendo
ser malcriado recitando, não deixa de ser poeta. Feliz no aturdir, lá vai a
cair na saudade o poeta borrachão com soluços no coração.
De lágrimas em pinguinhas imita a comoção cómica que
lhe vai na alma.
Submerso solta quadras às avessas.
De tanto trocar o verso… jura, benze-se… tropeça, e
novamente pede desculpa de trocar o passo, tombando no chão de barriga pró céu.
Entorpecido, o borrachão poeta de cara virada para as
estrelas… sorri àquela lua... e a ela declara o seu amor por ser tão bonita,
que é com toda a certeza a Deusa mais bela por quem ele alguma vez se
apaixonou. A única vez, claro, porque é sério quando faz versos à sua musa, e
porque é filho duma mãe por quem sente ternura... ou se sente ou não se
sente... mas nunca mente.
Seu último olhar é pró firmamento, feliz de piscar os
olhos àqueles pontinhos mágicos como se fossem chamas de velas perdidas naquela
escuridão celestial.
Ainda solta um último verso decadente… ao sonhar
com anjos tão belos de formas reais...
Seu corpo acolhe a estrelada noite de verão.
Contente, devaneia o poeta borrachão… e adormece
sonhando com o abraço das estrelas, naquela calçada de pedra como se fôsse a
cama mais quentinha do Universo, e o céu... o lençol do seu mundo.